viernes, 2 de enero de 2009

Tentar “ensinar uma lição ao Hamas” é fundamentalmente errado, por Tom Segev


Haaretz (em inglês), creio que o principal jornal israelense, é uma fonte importante para acompanhar o massacre do povo palestino. Como uma linha que se pode classificar de algo como "liberal humanista", naturalmente reproduz muitas posturas de apoio à ação do exército israelense. Mas também traz diversos artigos críticos e notícias que demonstram as contradições e interesses que movimentam a máquina de guerra sionista.


Tom Segev é um historiador israelense, daquela corrente que disseca os mitos fundadores do Estado de Israel (que se fundamentam nos dogmas do judaísmo, não nos esqueçamos). Aqui, uma entrevista dele à revista época em outro contexto, da qual destaco dois trechos.


Sobre a condição a que está submetido o povo palestino e suas motivações:


"O grande erro que a maioria comete é não perceber que os palestinos não ganharam nada com os acordos de Oslo. Para muitos deles, a situação ficou pior. Surgiram novos bloqueios, tornando muito mais difícil entrar em Israel e conseguir trabalho. Em segundo lugar, os palestinos foram deixados sob uma administração corrupta e ineficiente, chefiada por Arafat. Os assentamentos foram expandidos, mais terra foi tirada dos palestinos. Ficou fácil para eles se desesperarem, e é por isso que surgem tantos terroristas suicidas. Eles não vêem futuro."


Sobre a possibilidade de uma normalização da sociedade israelense:


"Estávamos a caminho disso. Eu estava muito otimista com a perspectiva de Israel se tornar uma democracia multicultural. Estávamos no rumo de um período pós-sionista, não-ideológico de nosso desenvolvimento. A violência dos últimos 19 meses nos empurrou para trás, para um tipo de familiaridade tribal, o sentimento de ser um povo sitiado, cercado por inimigos."






El Roto
. Publicada no El País - 30 - 12- 2008,

Reproduzida em O Caderno de Saramago


Agora sim, o texto publicado recentemente em Haaretz:

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Tradução para o português retirada de

http://www.vermelho.org.br/base.asp?texto=48957


Sábado pela manhã, o Channel 1 da televisão israelense fez uma misturada interessante: os correspondentes falavam de Sderot e Ashkelon, mas as imagens que se viam na tela eram imagens da Faixa de Gaza. Provavelmente sem querer, acabaram por veicular a mensagem correta: uma criança em Sderot é igual a uma criança em Gaza, e seja quem for que a fira ou mate comete sempre o mesmo crime.

O assalto a Gaza exige sempre, em primeiro lugar, condenação moral – mas merece também avaliação histórica. Tanto as justificativas para o ataque a Gaza quanto os alvos escolhidos são replay das mesmas idéias que repetidamente se têm mostrado erradas, guerra após guerra. Pois Israel continua a tirá-las da cartola, sempre, guerra após guerra.


Israel está matando palestinos, para "dar-lhes uma lição". É idéia que acompanha a empreitada sionista desde o primeiro dia: 'nós' representaríamos o progresso e as luzes, a racionalidade e a moralidade de escol; os árabes seriam gente primitiva, violenta, escória que teria de ser educada e receber lições da 'nossa' sabedoria – mediante, claro, táticas de cenoura-e-chicote, como se faz para fazer andar o burro.


O bombardeio de Gaza visa também, supostamente, a "liquidar o regime do Hamás", outra idéia que acompanha o movimento sionista desde o primeiro dia: a idéia de que seria possível impor uma liderança "moderada" na Palestina, uma liderança que esqueceria todas suas aspirações nacionais.


Como corolário, Israel também sempre acreditou que causar sofrimento aos palestinos os levaria a levantar-se contra seus líderes nacionais. Isso já foi tentado várias vezes e fracassou sempre que foi tentado.


Todas as guerras de Israel basearam-se também em outra pressuposição sionista, que acompanha Israel desde o início: que em todos os casos, Israel só se defende. "Meio milhão de israelenses estão sob fogo", urrava a manchete da edição de domingo do Yedioth Ahronoth – como se a Faixa de Gaza não enfrentasse bloqueio e sítio terríveis, muito longos, que já destruíram as chances de várias gerações de palestinos viverem vida que valha a pena viver.


É reconhecidamente impossível viver sob fogo diário, ainda que não haja lugar no mundo que viva em situação de terror-zero. Mas o Hamás não é a organização terrorista que aprisionou toda a população de Gaza: é um movimento religioso nacionalista, e a maioria dos habitantes de Gaza crêem nesse ideário. Pode-se, é claro, discordar, e, às vésperas de eleições para o Parlamento, esse ataque pode, até, levar a algum tipo de acordo de cessar-fogo. Mas há outra verdade histórica que não se pode esquecer: desde o primeiro momento da presença dos sionistas em Israel, nenhuma operação militar jamais fez avançar qualquer diálogo com os palestinenses.


O mais perigoso, dentre todos os clichês que Israel repete, é o clichê que diz que não há parceiros para discutir a paz. Isso jamais foi verdade. Há muitos meios pelos quais conversar com o Hamás, e Israel tem algo a oferecer que interessa a eles. Pôr fim ao bloqueio de Gaza e permitir livre movimentação entre Gaza e a Cisjordânia tornaria outra vez possível a vida na Faixa.


Ao mesmo tempo, vale a pena tirar da gaveta os velhos planos preparados depois da Guerra dos Seis Dias, que previa que milhares de famílias fossem realocadas, da Faixa de Gaza para a Cisjordânia. Aqueles planos jamais foram implementados, porque se decidiu que a Cisjordânia seria usada pelos colonos judeus. Esse foi o mais estúpido de todos os erros.


Fonte: Haaretz, Telavive, 29/12/2008, Traduzido por Caia Fittipaldi.

(http://www.haaretz.com/hasen/spages/1050706.html)

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